Os olhos plácidos de Luciana Borghi disfarçam toda a complexidade dramática da intérprete que mais parece um camafeu. Com gestos lentos e postura de mulher de época, a simpática atriz de 36 anos não disfarça sua familiaridade com papéis mais dramáticos. Desde quando estreou na TV como a tatuadora Bárbara Lee, em Tempos Modernos, uma estilosa e complexa personagem, ao mesmo tempo séria e de estilo retrô, já dava para perceber o tom mais forte que a artista imprimia aos seus papéis. Em seu segundo trabalho na TV, Luciana, que já tem uma longa trajetória no teatro como atriz, roteirista e diretora, se identifica com Railda, sua personagem em Malhação. Principalmente pela abordagem do tema da personagem, que é uma mãe biológica que abandonou o filho. Ela aparece anos depois para conhecer o filho Téo, de Ronny Kriwat. Nessa semana, inclusive, mãe e filho passam a morar juntos no folhetim. "Me considero recomeçando na TV. Acho que não consigo me livrar desse tom dramático e denso. Tenho muita intensidade no que faço", ressaltou.

A Railda é sua segunda personagem na TV e reafirma o perfil dramático na sua atuação. Como tem sido viver um papel tão denso em Malhação, que é um folhetim mais suave?
Eu realmente tenho esse perfil e gosto dessa veia dramática, mas a Railda também exige essa carga. Mas sabemos que não podemos pesar muito nesse horário. Tudo tem de ser na medida, mesmo essa personagem sendo complexa. Afinal, estamos em Malhação, que exige mais sutileza. Mesmo assim, gravo sequências de muita emoção, que parecem drama de novela das oito. Acho importante e pertinente falar de temas fortes como a adoção para os jovens. Mostrar como o Téo foi adotado, como ele administra isso, o reencontro dele com a mãe biológica, mostrar o sentimento das duas famílias.

Que referências você buscou para essa composição?
Todos os assuntos ligados à adoção sempre me chamaram a atenção. Esse assunto é muito forte para mim. Tem um filme que acho lindo e que revi, que é Segredos e Mentiras, do Mike Leigh.

Você tem alguma relação pessoal com adoção?
Tenho. Convivo com muitas pessoas que são adotadas. Tenho histórias próximas na minha família. Não posso me estender muito. O fato é o seguinte: eu sou adotada. Só que eu não quero de forma alguma que isso seja o foco da questão. O que estou vivendo com essa personagem é uma grande coincidência. Estou fazendo o papel que nunca imaginei: o da mãe biológica. Tudo relacionado à isso me emociona.

Como tem sido lidar com essa personagem com seu histórico familiar?
É delicado, mas com a Railda eu vivo o outro lado. Na trama, ela é a mãe biológica do Téo (vivido por Ronny Kriwat). Ela abandonou o filho ainda bebê. Consegue reencontrá-lo num site e o reconhece através da foto dele e da história que ele conta. Faz um exame de DNA e comprova que é sua mãe, só que ela volta rica e a família adotiva é pobre. Esse conflito é doloroso, o encontro dela com a mãe adotiva dele, a Lurdes (interpretada pela Sandra Corveloni). As duas viram onças pela cria. É uma adaptação difícil para todos.

Além de atuar, você escreve e dirige no teatro e tem feito oficinas sobre Jorge Amado. Tem projetos de também escrever para a TV?
Tenho um projeto de montar em 2012 algo sobre Jorge Amado. Tenho ideias de adaptações para o cinema, TV e teatro. Infelizmente há um grupo de intelectuais que ainda acha a literatura de Jorge Amado menor. Neste ano, além de Malhação, ainda estou rodando a Bahia e Porto Alegre com a peça Transtorno Feminino, que eu escrevi nos bastidores da novela Tempos Modernos. Falo sobre os bastidores da TV, que é o veículo que mais tem me instigado nos últimos anos e de onde não quero mais sair. Pretendo emendar um trabalho no outro.